O Poder Judiciário pós-pandemia e o Juízo 100% digital

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O Poder Judiciário pós-pandemia e o Juízo 100% digital

 

O Conselho Nacional de Justiça aprovou por unanimidade em sua 319ª sessão ordinária o texto da resolução que regulamentará o “Juízo 100% digital”, autorizando, portanto sua implementação por todos os Tribunais. O acórdão foi publicado nesta manhã (07/10/2020)1.

Na forma do parágrafo único do artigo primeiro da citada resolução: “No âmbito do “Juízo 100% Digital”, todos os atos processuais serão exclusivamente praticados por meio eletrônico e remoto por intermédio da rede mundial de computadores”.

Uma vez implantado pelos Tribunais, a adoção do formato “100% digital” pelas partes, no primeiro momento, será facultativa. O demandante fará a opção pelo formato no ato da distribuição da ação, podendo o demandado se opor no momento da contestação.

Em seu voto, o Presidente do Conselho Nacional de Justiça, Ministro Luiz Fux, justificou a medida nos seguintes termos:

Como é de conhecimento geral, as inovações tecnológicas entrarão em cena para a transformação revolucionária da prestação jurisdicional, sem olvidar a coexistência com o trabalho humano. Em tempos de restrições orçamentárias, soluções criativas, de baixo custo, porém com alto impacto estrutural, precisam ser estimuladas.

O Poder Judiciário tem se reinventado nos últimos anos ao ingressar na era digital. No futuro, os fóruns não necessitarão de espaços físicos, pois todos os serviços serão oferecidos on-line. Isso tende a diminuir muito as despesas, pois tudo estará disponível na Internet. O alinhamento entre a inteligência humana e artificial também melhorará o gerenciamento de processos e de recursos humanos. Os robôs realizam em segundos o trabalho de centenas de funcionários.

Também é cediço que a pandemia do coronavírus testou a capacidade de resiliência institucional do Poder Judiciário como nunca em nossa história contemporânea. Com velocidade e senso de adaptação, conseguimos prestar jurisdição ininterruptamente com ganho de produtividade por meio da utilização da tecnologia. À guisa de exemplo, apenas o Tribunal de Justiça de São Paulo produziu, até o momento, mais de 15,4 milhões de atos processuais, com o registro de 4 milhões de acessos remotos.

Assim, temos sido simultaneamente espectadores e protagonistas de uma das maiores transformações da história da humanidade: o sepultamento da era analógica e o resplandecer da era digital, em que o big data se torna a fonte principal de produção de dados públicos.

(Processo CNJ 0007913-62.2020.2.00.0000, publicado em 07/07/2020, Rel. Min. Luiz Fux.)

No ano de 2020, em decorrência da Pandemia do COVID-19, o Judiciário, experimentou o fechamento integral de suas estruturas físicas desde o mês de março, que apenas agora dá sinais de retomada, mesmo assim de forma lenta e gradual.  Durante todo esse período, só não houve a completa interrupção das atividades pela utilização da tecnologia.

O Covid-19 trouxe então a mudança de paradigma. Para evitar a suspensão integral das atividades do Poder Judiciário, foram introduzidos no dia a dia forense os softwares de transmissão simultânea de imagem e vídeo. Cisco Webex, Google Meet, Zoom e Microsoft Teams, nomes até então desconhecidos para a maioria dos operadores do direito,  passaram a ser utilizados de forma frequente.

A realidade é que o chamado “Novo Normal” já está implantado e o “Juízo 100% digital” veio para ratificar os atos daqueles que buscaram a inovação e utilizaram a Pandemia para melhorar a gestão, aperfeiçoar os processos e rever a estrutura.

Trata-se de um movimento de todo o mercado. São diversas as notícias de empresas que não retomarão as atividades em seus grandes centros administrativos, refletindo no mercado imobiliário. O home office, que há muito era anunciado, se tornou realidade exigindo mudança de mindset dos gestores, que precisam inovar na forma de motivar e de se comunicar com a equipe.

Em que pese a evolução do formato digital ter sido experimentada durante a pandemia, o ambiente está sendo preparado há pelo menos 15 anos.

Ao buscar o histórico do Processo Judicial Eletrônico, constata-se que no ano de 2005, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul adotou o processo eletrônico na 10ª Vara do Juizado Especial de Campo Grande. Em 2006, o Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba foi o primeiro a ter todas as suas varas em formato eletrônico, iniciando um movimento que se espalhou por todo o Poder Judiciário2.

No ano de 2006 foi editada a Lei 11.419, que “Dispõe sobre a informatização do processo judicial; altera a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil; e dá outras providências”, já prevendo a comunicação eletrônica dos atos processuais.

Em 2012, O Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CSJT, através da resolução Nº.94, regulamentou o PJe-JT no âmbito daquela justiça especializada.

O Conselho Nacional de Justiça, em 2013, editou a Resolução nº185, que objetivou “Instituir o Sistema Processo Judicial Eletrônico – PJe como sistema informatizado de processo judicial no âmbito do Poder Judiciário e estabelecer os parâmetros para o seu funcionamento”.

Em paralelo a estas resoluções, tramitava no Congresso Nacional desde o ano de 2010 o projeto do Novo Código de Processo Civil, sancionado em 16 de março de 2015 com diversas previsões de atos processuais em formato eletrônico. O Código menciona 82 vezes em seu texto a palavra “eletrônico”, além de citar em dez oportunidades a palavra “digital”.

Dentre esses dispositivos há o art. 193, que dispõe textualmente que “Os atos processuais podem ser total ou parcialmente digitais, de forma a permitir que sejam produzidos, comunicados, armazenados e validados por meio eletrônico, na forma da lei”.

Nesse sentido, já não se tem dúvidas quanto à existência da proteção jurídica necessária à completa digitalização do processo.

Ademais, a própria Constituição Federal garante em seus Direitos Fundamentais o Acesso à Justiça e à Duração Razoável do Processo. Em se tratando de um Poder Judiciário que já não consegue ter estrutura suficiente para dar efetividade a esses princípios, julgando em tempo razoável o elevadíssimo número de processos (conforme anualmente registrado no Relatório Justiça em Números, editado pelo próprio CNJ), a mudança de paradigma e a rapidez trazida pela tecnologia é fundamental.

A revolução tecnológica já atingiu as instituições financeiras, com as fintechs, bancos digitais e home brokers, o transporte público, com o Uber e similares, o turismo, com as agências digitais, Booking e afins. É a vez das Lawtechs e Legaltechs, cuja associação brasileira (AB2L) já contava, em 2019, com 150 startups3.



Pedro Marques

Coordenador do Departamento de LGPD do escritório Décio Freire Advogados.


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